I. ÉTICA EM PLATÃO
- RELAÇÃO DE TEORIA DO CONHECIMENTO E TEORIA ÉTICA
Mundo das ideias : Platão foi um filósofo que dedicou-se ao estudo de diversas áreas. Seus diálogos abordam temas como epistemologia, política, estética, ética, metafísica, entre outros. Este texto possui um foco particular, que é apresentar as principais características do Mundo das Ideias, um dos principais pilares da filosofia platônica. O Mundo das Ideias parece surgir para Platão como uma proposta reflexiva que sintetiza estas oposições anteriores. Platão compreende que existem dois planos distintos: um deles é estável, o outro instável. O que o filósofo chamou de Mundo das Ideias é imutável, eterno e real, e opõe-se ao Mundo Sensível, em que os objetos são passageiros, caracterizados pela mutabilidade e ilusórios. Este último é o mundo das aparências, das cópias imperfeitas daquilo que se encontra no Mundo das Ideias que, por sua vez, é o mundo da Episteme(verdades) e o Mundo Sensível o mundo traçado pela doxa (opinião), através do qual, portanto, não se atinge a verdade. Isto significa que no primeiro mundo as coisas existem em sua essência e como absolutas, enquanto que no segundo, apenas existem de maneira aparente, não como realmente são em si.
O Mundo Sensível é
o mundo que apreendemos, que sentimos e que vivemos. Neste plano existem apenas
cópias das Formas verdadeiras que encontram-se no Mundo das Ideias. Para
Platão, a razão é o instrumento que possibilita o conhecimento das verdades
eternas que encontram-se no referido mundo perfeito. Através do exercício
intelectual, o homem pode relembrar verdades que já encontram-se em seu íntimo
e que foram anteriormente assimiladas pela alma no Mundo das
Ideias.Primeiramente, é importante esclarecer que este tema é tratado em mais
de um diálogo platônico e consiste em um dos principais fundamentos do
pensamento do filósofo. Para entender as razões que possivelmente motivaram
Platão a desenvolver esta parte de sua filosofia, precisamos resgatar alguns
aspectos do pensamento pré-socrático, tendo como foco, especialmente duas
propostas feitas por dois pensadores específicos que antecederam Platão:
Heráclito e Parmênides. O primeiro, em suas tentativas de buscar elementos que
explicassem a natureza, entendeu e afirmou que a realidade que o cercava era
aparente, ou seja, estava em constante transformação (devir). Em oposição,
Parmênides assegurou que a realidade não se altera e negou a ideia de movimento
contínuo da natureza.
Estas aparências
encontradas no Mundo Sensível teriam sido criadas por um ser superior chamado
por Platão de Demiurgo (que seria um artesão). Este, teria montado um mundo
imperfeito que copia as formas perfeitas e, assim, as essências existentes
neste plano ideal proposto por Platão possuem a forma primordial da qual se
originam as coisas que o homem conhece através da realidade sensível. Ou seja,
há uma forma da qual tudo se origina. Por exemplo, pensemos em uma caneta: por
mais que haja uma variedade de modelos deste mesmo objeto, ainda assim, existe
uma “ideia primordial” básica do que ela é, quer dizer, há uma ideia de
caneta. Para ilustrar este pensamento, Platão utilizou-se de uma alegoria
que se tornou conhecida como “Alegoria da Caverna” ou “Mundo da Caverna”. Neste
texto metafórico, conta que havia uma caverna na qual muitos prisioneiros,
desde seus nascimentos, lá viviam acorrentados. Viam sempre sombras projetadas
nas paredes que eram formadas pela luz de uma fogueira, e acreditavam que as
imagens que elas formavam era a realidade. Mas supõe-se que um dos homens da
caverna consegue escapar daquele local, e sair de tal ambiente. Quando chega ao
mundo externo, a verdadeira luz quase o cega. Seus olhos doem, mas ele se
adapta. Logo percebe que sempre viveu acorrentado numa ilusão que acredita ser
uma verdade absoluta. Lá fora, ele vê os verdadeiros seres cujas imagens
projetavam-se de maneira distorcida no interior da caverna. Ele decide voltar e
partilhar seu conhecimento com os outros homens que ainda estão
acorrentados. No entanto, estes homens zombam dele e não acreditam em seu
relato. Suponha que a caverna seja esta dimensão em que vivemos e que, muitas vezes
julgamos ser a realidade (Mundo Sensível). Em contraponto à este plano de
distorções e de sombras, existe uma realidade em si com objetos reais tal como
o são verdadeiramente. Este seria o Mundo das Ideias. Ressalte-se que o Mito da
Caverna possui outras interpretações além desta que foi exposta, mas
certamente, apesar de tais divergências interpretativas, simboliza muito
claramente a base da Teoria das Ideias.
ÉTICA DE PLATÃO
Platão propõe uma
ética transcendente, dado que o fundamento de sua proposta ética não é a
realidade empírica do mundo, nem mesmo as condutas humanas ou as relações
humanas, mas sim o mundo inteligível. O filósofo centra suas indagações na
idéia perfeita, boa e justa que organiza a sociedade e dirige a conduta humana.
As Idéias formam a realidade platônica e são os modelos segundo os quais os
homens tem seus valores, leis, moral. Conforme o conhecimento das idéias, das
essências, o homem obtém os princípios éticos que governam o mundo social.O uso
reto da razão é entendido como o meio de alcançar os valores verdadeiros que
devem ser seguidos pelos homens. No mito da caverna, o filósofo expõe a
condição de ignorância na qual se encontra o homem ao lidar com o conhecimento
das aparências. Somente pelo conhecimento racional o homem pode elevar-se até
as Idéias, até o Ser e conhecer a verdade das coisas. Isto se dá através do
método dialético, o qual elimina as aparências e encontra as essências, a
verdade no conhecimento das coisas. Este método filosófico tem por finalidade
libertar os homens da ignorância e levá-los ao conhecimento de idéia em idéia,
até alcançar o conhecimento da Idéia Suprema: o Bem. As outras idéias
participam desta e devem sua existência a esta.
O Bem ilumina o
ser com verdade, permitindo que seja conhecido, assim como o Sol ilumina os
objetos e permite que sejam vistos – nota-se aqui a analogia entre Bem e Sol
apresentada no mito da caverna. Existem diversas idéias e é devido à
participação nestas, mesmo que enquanto cópia imperfeita, que se fez possível o
mundo sensível. Ao contemplar a idéia do Bem, o homem passa a sofrer as
exigências do Ser, isto é, suas ações devem ser pautadas conforme a idéia
contemplada.A alma humana – de suma relevância para a ética platônica- é
tripartite, isto é, forma-se pela inteligência, pela irascibilidade e pela
concupiscência. Tal como as partes da cidade ideal, cada uma das partes da alma
possui suas funções específicas que não podem ser exercidas por nenhuma das
outras partes. Cada uma das partes da cidade e, por analogia, cada uma das
partes da alma, possui uma função própria a qual pode ser executada com
excelência ou não, e, ao executá-la com excelência, sua virtude própria é
exercida.
A virtude é
definida, pois, como capacidade de realizar a tarefa que lhe é inerente. No caso
do governante da cidade e da alma racional, a virtude inerente aos mesmos é a
sabedoria; no caso dos guerreiro e da parte irascível da alma, a virtude que
lhes é própria é a coragem; por fim, no caso da parte concupiscente da alma e
dos produtores de bens da cidade, a virtude própria é temperança. Dada a
posição de cada classe, pode-se definir a justiça como cada parte fazendo o que
lhe compete, conforme suas aptidões. Portanto, ao estabelecer uma relação de
analogia entre a sociedade e indivíduo, Platão define o conceito de justiça – o
qual seria também concebido como princípio de equilíbrio do indivíduo e da
sociedade – e o liga ao conceito de virtude.O sentimento de justiça é, pois, a
virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta
virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si mesmo, porque ele
realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social.
A ética platônica
ocupa-se com o correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade.
Contudo, o discurso ético apresentado na República acerca da felicidade
relaciona esta com o conceito de justiça. O problema da justiça enquadra-se no
âmbito político, o qual tem estreita relação com o campo da ética: é deste modo
que surge a tese central de que só o justo é feliz. No diálogo República,
buscando a constituição da cidade ideal, surge o problema cerne acerca da
definição da justiça para que se pudesse, posteriormente, definir o que é a
justiça tanto no indivíduo quanto no Estado. Há, pois, um paralelo entre Estado
e indivíduo a fim de que se encontre a definição de justiça.
Para Platão, a
sociedade seria como algo orgânico e bem integrado, como uma unidade construída
por vários elementos independentes, embora integrados. A cidade forma-se por três
classes, como já apontamos, e cada classe possui sua função específica. Deve-se
notar que tais funções são determinadas conforme as aptidões naturais de cada
membro da cidade. O objetivo desta divisão é mostrar com mais clareza como
ocorre o mesmo na alma humana. A finalidade da cidade justa e boa é, então,
propiciar a felicidade do indivíduo ao viabilizar a prática de suas virtudes,
de suas aptidões específicas. Devemos ter em mente que a virtude correspondente
a cada classe da cidade e a cada parte da alma humana deve ser ensinada visando
a realização do ideal da polis. Esta educação embasa-se no método dialético
ascendente, o qual liberta o homem dos sentidos e o eleva até o mundo
inteligível, até o ponto mais claro do Ser, a idéia do Bem. Após contemplar o
Bem diretamente, o filósofo deve retornar à cidade que lhe propiciou educação
de modo a guiar os outros cidadãos da ignorância ao conhecimento racional. As
idéias – das quais se originam as cópias sensíveis – são, pois, existentes em
si e por si, são realidades universais, eternas, imutáveis. Por tais motivos,
são os modelos a serem seguidos, são paradigmas para a construção da cidade
ideal e para a educação moral, política e espiritual do homem. Além do mais,
são ordenadoras do cosmos.
Fica evidente que
a proposta de Platão liga-se, principalmente, às idéias de Justiça e do Bem –
este último é o supremo valor que sustenta a justiça com relação à organização
política e à conduta individual. O equilíbrio entre as três partes componentes
da alma e da cidade gera equilíbrio, harmonia e leva à felicidade. Assim,
Platão busca por definições gerais, universais, imutáveis, eternas, existentes
por si mesmas: as Idéias. Como veremos adiante, tal busca é oposta à busca
aristotélica pela virtude ligada à aplicabilidade desta.
O pensamento de Platão foi muito
influenciado pelas filosofias de Heráclito e Parmênides. Ele
procurou reconciliar ambas as posições. Foi da controvérsia dessas duas
filosofias que surgiu a “teoria das idéias”, núcleo central de sua filosofia. O
problema que Platão propõe a resolver é o conflito “irreconciliável” entre a
teoria da mudança em Heráclito e Parmênides. Para Heráclito, no
universo não há nada acabado, fixo e estável, tudo está em permanente mudança.
Sua metafísica identifica o Ser com o Não-Ser. Se o mundo é devir, vir-a-ser,
não existe um Ser fixo, estável, ele está sempre se transformando,
é sempre impermanente. Já para Parmênides, as coisas que
existem têm múltiplas características, são pequenas, grandes, coloridas,
pesadas, leves, são diferentes, como homem, animal, água, fogo, etc. Se usarmos
a intuição e o raciocínio, perceberemos que há uma propriedade fixa em todas as
coisas: elas “são”. Para Parmênides, o ser é uma propriedade de todas as
coisas. Tudo que existe tem “Ser”. O Ser é fixo, eterno, imutável,
infinito. Dessa forma, as mudanças e transformações que ocorrem na natureza são
uma ilusão de nossa percepção, pois algo que é não pode deixar de ser, e algo
que não é, não pode vir-a-ser, portanto, não há mudança.
Para reconciliar ambas as teorias, Platão
mostrou-nos que todos nós estamos sempre em contato com duas realidades: uma
inteligível e outra sensível. A primeira é permanente, universal, nunca se
modifica, é o mundo das idéias. A segunda, é o mundo que percebemos por
nossos sentidos, mutável e contingente, o mundo sensível. Platão
demonstra que o mundo tem uma forma a priori, uma estrutura inteligível.
“Através dos diálogos, Platão vai caracterizando essas causas
inteligíveis dos objetos físicos que ele chama de idéias ou formas. Elas seriam
incorpóreas e invisíveis – o que significa dizer justamente que não está na
matéria a razão de sua inteligibilidade. Seriam reais, eternas e sempre
idênticas a si mesmo, escapando a corrosão do tempo, que torna perecíveis os
objetos físicos. Merecem por isso mesmo, o qualificativo de ‘divinas’ (…).
Perfeitas e imutáveis, as idéias constituiriam os modelos ou paradigmas dos
quais as coisas materiais seriam apenas cópias imperfeitas e transitórias.
Seriam, pois, tipos ideais, a transcender o plano mutável dos objetos físicos.”
(Pessanha, 1987, XVI-II).
A
teoria das idéias de Platão está diretamente ligada a sua teoria da
alma. Na parte IV , do seu livro “República”, Platão
concebe o homem como corpo e alma. Enquanto o corpo modifica-se e envelhece, a
alma é imutável, eterna e divina. A alma inteligente preso ao corpo um dia foi
livre e contemplou o mundo das idéias, mas as esqueceu. É somente através da
busca do conhecimento, através de um processo de recordação, de reminiscência,
o homem pode lembrar-se das idéias que um dia contemplou. A
realidade sem forma, sem cor, impalpável só pode ser contemplada pela
inteligência, que é o guia da alma.
Platão divide a
alma em três partes. O lado racional está localizado na cabeça, seu objetivo é
controlar os dois outros lados, com ele adquirimos a sabedoria e a prudência. O
lado irascível está localizado no coração, seu objetivo é fazer prevalecer os
sentimentos e a impetuosidade, com ele adquirimos a coragem. Por último, temos
o lado concupiscente que está localizado no baixo-ventre, seu objetivo é
satisfazer os desejos e apetites sexuais, com ele adquirimos a moderação ou a
temperança. No Mito do Cocheiro, no diálogo “Fedro”, Platão compara a
alma a uma carruagem puxada por dois cavalos, um branco (irascível) e um negro
(concupiscível). O corpo humano é a carruagem, e o cocheiro (Razão) conduz
através das rédeas (pensamentos) os cavalos (sentimentos). Cabe ao homem
através de seus pensamentos saber conduzir seus sentimentos, pois somente assim
ele poderá se guiar no caminho do bem e da verdade.
Platão afirma, que não podemos ser felizes quando somos dominados pela
concupiscência e pela cólera, isso porque as paixões sempre nos conduzem por
caminhos perigosos e contraditórios e fazem com que os desejos e impulsos
violentos de nosso corpo tirem nosso bom senso. Já dizia Sócrates que
todo vicio é ignorância. Não há nada mais deprimente do que uma pessoa que age
por impulsos e é dominada pelas paixões. Ter autocontrole é essencial para
sermos felizes. A felicidade só pode ser alcançada se formos capazes de dominar
nossos sentimentos pela razão. A moderação é uma virtude, e ela se
realiza quando somos capazes de controlar a nossa concupiscência. O indivíduo
moderado é aquele que não cede as suas paixões, impulsos e prazeres. Da mesma
forma, o indivíduo não se lançara a luta e a agressão
indiscriminadamente, uma vez que a razão deve saber discernir o que é bom e mal
para nossa vida, sabendo dominar a nossa alma irascível. Dessa forma, seremos
felizes se através da razão soubermos controlar nossa vida, pois a virtude
natural da razão é o conhecimento.
SINOPSE DA
OBRA FEDÓN:
A tarefa do
filosofo é a busca da verdade, e esta implica na libertação progressiva de toda
a materialidade. O filosofo não deve temer a morte, já que esta lhe permite
alcançar toda a verdade. A vida do filosofo é a busca do desprendimento total
do corpo, pois este constitui um obstáculo ao conhecimento, dado que o
filosofar consiste em desprender a alma dos impulsos e desejos do corpo; O
conhecimento das coisas em si não se alcança pela percepção sensível, e sim
pelo pensamento; O conhecimento total da verdade só se da após a vida, quando a
divindade nos liberta do corpo, e em vida o conhecimento só é possível
abstendo-se de todo o comércio com o corpo; O filosofo aspira libertar a alma
do corpo e sua tarefa é operar esta libertação. Sendo assim, seria absurdo que
o filosofo se indignasse na hora da morte. No entanto, é ilegítimo o desejo do
suicídio, pois os homens pertencem aos Deuses. Ninguém deve partir da vida sem
ser forçado pela divindade.A causa da ilegitimidade do suicídio e o objeto da
filosofia implicam na natureza simples da alma – para que esta possua
identidade com as essências -, na sua preexistência à vida e na sua
imortalidade.
Argumentos à
imortalidade, à preexistência, e à natureza simples da alma. Teoria
dos Contrários – A lei geral da natureza (Devir Heraclitiano)
mostra que todo o contrário surge do seu contrário: o feio do belo, o pequeno
do grande, etc.; Assim a morte nasce da vida e a vida desta, caso contrario,
não sendo desta maneira, haveria uma negação da lei geral da natureza. Se assim
não fosse, o universo imobilizar-se-ia. Então, os vivos nascem dos mortos, e
vice e versa; e, para isso as almas devem preexistir em algum lugar antes de
regressarem à vida. A alma é princípio de vida.
Teoria das
Reminiscências – Pelos sentidos observa-se a
existência de coisas, mas que, no entanto, não são perfeitas como a noção que
temos delas; As coisas não são perfeitas como suas ideias. A alma como
pensamento identifica-se com as ideias imutáveis e imperecíveis. Admite-se que
a alma contemplou as essências numa outra vida ideal (Topos Uranos), e
que, depois de sua ligação ao corpo, é necessário recordar o que se encontra
num estado latente – Conhecer é recordar; Para lembrar-se de algo é necessário
que se tenha sabido no passado. A percepção sensível de um objeto nunca
coincide com idéia pura. A idéia é anterior, portanto, não deriva do objeto, e
sim, esses apenas a despertam, mas, não as geram; A realidade sensível desperta
a realidades inteligíveis que foram contempladas no mundo ideal, antes da
ligação da alma com o corpo.
Teoria das Ideias
e da Simplicidade da Alma, e sua Identidade com as Ideias – As
ideias, realidades inteligíveis, são eternas e isentas de composição; Em
oposição ao sensível que é composto e destrutível; A alma não é composta, é
simples, indestrutível como as ideias são; As essências não estando sujeitas a
mudanças permanecem na identidade: o belo em si; Os seres chamados belos nunca
permanecem na identidade: O homem, o cavalo, etc.; As essências são, somente,
apreendidas pelo pensamento. Os objetos, os seres belos, são apreendidos,
somente, pelos sentidos. Há duas espécies de seres: os visíveis, que não
permanecem do mesmo modo, e os invisíveis, que são imutáveis. O corpo
identifica-se com o visível e a alma com o invisível; O espírito que conhece (alma
ou pensamento) e as ideias são semelhantes, pois que se identificam; O
semelhante só pelo semelhante pode ser conhecido. Se as ideias são eternas, a
alma que as conhece também é eterna e como tal, imperecível. A existência terrena
consiste na união da alma com o corpo e a morte significa, apenas, a
decomposição do que é composto (corpo), e não do que é simples (alma).
O corpo se identifica com o mortal e a alma com o divino.
Objeções de Símias
e Cebes, que aceitaram o argumento da reminiscência, admitindo a preexistência
da alma, mas não sua imortalidade. Símias,
e Argumento da Lira: as almas são produto da matéria e
deixam de existir quando a matéria é destruída, tal como a destruição da lira implica
necessariamente a destruição da harmonia, produzida pela lira. A
alma ou pensamento é um epifenômeno, um fenômeno originado de uma
causa primária.
Sócrates, em
resposta a Símias: A lira é anterior à harmonia, e por isso, a
lira é o fundamento da harmonia; a alma é anterior ao corpo, então, esta não
poderia ser harmonia do corpo. A alma é anterior ao corpo admitindo o argumento
da reminiscência, portanto sendo anterior ao corpo a alma não poder ser causada
por ele, como a harmonia é o efeito da lira.
Cebes, e Sua
objeção: A demonstração de que a alma é resistente e divina
e de que preexiste ao corpo não implica na a sua imortalidade, mas, apenas a
sua longa duração.
Sócrates, em
resposta a Simias: Diz ter examinado as causas
que dizem respeito à geração e destruição para que pudesse demonstrar o lugar
da alma na sucessão dos contrários; Estudou durante anos a natureza para
descobrir o motivo do nascimento, a vida e a morte dos vários seres. No
entanto, as explicações e o método utilizado pelos físicos não o satisfizeram
porque eles confundiam a causa com o efeito. A filosofia de Anaxágoras ao se
referir à ação do espírito ordenador e causa de tudo o que existe, permitiu-lhe
a superação das explicações dos físicos. Mas Anaxágoras se desviou do caminhou
que havia traçado, e acabou por cair nas explicações físicas tradicionais. A
explicação da ordem do universo tem de ser da mesma natureza do espírito,
inteligível. Anaxágoras falseou a estrutura da explicação inteligível quando
passou do plano da causalidade inteligível ao plano da causalidade física – da
causa espiritual aos meios de execução. Portanto, o espírito é o ordenador da
natureza; A realidade sensível só pode ser explicada pela vinculação ao
inteligível. É por causa do belo que as coisas belas são belas; nada mais torna
bela a coisa do que a presença ou participação daquele belo, realizada de
qualquer modo que seja.
Desenvolvimento à
Teoria dos Contrários. Sócrates, ainda, em
resposta a objeção de Cebes: Os contrários não podem subsistir
simultaneamente, a grandeza em si não aceita ser grande e pequena ao mesmo
tempo. Está informação não contradiz o primeiro argumento dos contrários (de
que a origem dos contrários são seus contrários). Afirmar que de uma coisa
contrária nasce outra contrária é diferente de afirmar que o próprio contrário
não pode ser contrário de si mesmo. Ou seja, afirmar que, pelo fato de o corpo
humano passar da vida à morte, não significa que a vida, como essência, torne
seu contrário. A essência da alma é ser vida e exclui o seu contrário que é a
morte. A alma que é da mesma natureza das essências imortais é imortal e
indestrutível.
O Destino das
Almas e a Apologia à Filosofia, o Mito. Se a alma é
imortal que tipo de vida leva para além da morte? Nem a razão nem a experiência
poderão responder a esta dúvida. Segue, então, o recurso ao mito para explicar
o destino das almas: se a alma é imortal, exige da parte dos homens algum
cuidado. A única possibilidade de fugir ao mal é adquirir a sabedoria no mais
alto grau e a preocupação permanente com a moral.
A filosofia é libertadora
porque o objeto da sua reflexão é, apenas, o inteligível, o invisível; É a
preparação para morte. A alma do filosofo ligar-se-á ao que tem afinidade com
ela, ao que lhe é semelhante. A alma dos bons, depois da morte do corpo, vai
para o que se lhe assemelha, para o invisível, divino e imortal. Mas nem todas
as almas têm o mesmo destino. As que viveram segundo paixões, terão de expiar o
gênero de vida censurável que antes tiveram, vagando até que reencarne, de
novo. As almas têm o destino em conformidade com os seus costumes. Aproximar-se
da espécie divida só é permitido a quem amou a sabedoria e não àquele que não
se preocupou com sua purificação.
O MITO DO
COCHEIRO:
No Mito do Cocheiro Platão nos conta: “A diferença entre a alma imortal dos deuses e a alma imortal dos
homens é que os cavalos e cocheiros das almas divinas são bons e de boa raça.
Os das almas humanas, mestiços. O cocheiro que os governa, conduz uma parelha
na qual um dos cavalos é bom e de boa raça, enquanto o outro é de má raça e
natureza contrária. Assim, conduzir o nosso carro é ofício difícil e penoso.
Nosso carro é puxado para cima por um dos corcéis, mas puxado para baixo pelo
outro. A luta da parelha força o cocheiro a olhar os cavalos e não o abismo. A
parelha machuca, o cocheiro tem as mãos feridas pelas rédeas que puxam em
direções contrárias, carros chocam-se com outros e vão perdendo a força,
caindo, até que o carro, pesado, caia no abismo.
O cavalo branco tem o corpo harmonioso e bonito; pescoço altivo e focinho curvo, cor branca, olhos pretos; ama a honestidade e é dotado de sobriedade e pudor, amigo como é da opinião certa. Não deve ser fustigado e sim dirigido apenas pelo comando e pela palavra.
O cavalo negro é torto e disforme; segue o caminho sem firmeza; com o pescoço baixo, tem um focinho achatado e a sua cor é preta; seus olhos de coruja são estriados de sangue; é amigo da soberba e da lascívia; tem as orelhas cobertas de pelos. Obedece a contragosto ao chicote e ao açoite.”No mito o Cocheiro representa a vontade, os Cavalos as Forças Positiva e Negativa e o Carro representa a matéria ou o plano material. Ou seja, a Vontade (Cocheiro) se utiliza dos Cavalos (Forças) para puxar o Carro (Matéria/Intento). O Cocheiro é a vontade humana que mediante a força vital (Cavalos) move o corpo físico (Carroça).
O cavalo branco tem o corpo harmonioso e bonito; pescoço altivo e focinho curvo, cor branca, olhos pretos; ama a honestidade e é dotado de sobriedade e pudor, amigo como é da opinião certa. Não deve ser fustigado e sim dirigido apenas pelo comando e pela palavra.
O cavalo negro é torto e disforme; segue o caminho sem firmeza; com o pescoço baixo, tem um focinho achatado e a sua cor é preta; seus olhos de coruja são estriados de sangue; é amigo da soberba e da lascívia; tem as orelhas cobertas de pelos. Obedece a contragosto ao chicote e ao açoite.”No mito o Cocheiro representa a vontade, os Cavalos as Forças Positiva e Negativa e o Carro representa a matéria ou o plano material. Ou seja, a Vontade (Cocheiro) se utiliza dos Cavalos (Forças) para puxar o Carro (Matéria/Intento). O Cocheiro é a vontade humana que mediante a força vital (Cavalos) move o corpo físico (Carroça).
ÉTICA DE
PLATÃO E ARISTÓTELES: DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS
A Ética de Platão: Platão propõe uma ética transcendente, dado que o fundamento de
sua proposta ética não é a realidade empírica do mundo, nem mesmo as condutas
humanas ou as relações humanas, mas sim o mundo inteligível. O filósofo centra
suas indagações na Ideia perfeita, boa e justa que organiza a sociedade e
dirige a conduta humana. As Ideias formam a realidade platônica e são os
modelos segundo os quais os homens tem seus valores, leis, moral. Conforme o
conhecimento das ideias, das essências, o homem obtém os princípios éticos que
governam o mundo social.
O uso reto da razão é entendido como o
meio de alcançar os valores verdadeiros que devem ser seguidos pelos homens. No
mito da caverna, o filósofo expõe a condição de ignorância na qual se encontra
o homem ao lidar com o conhecimento das aparências. Somente pelo conhecimento
racional o homem pode elevar-se até as Ideias, até o Ser e conhecer a verdade
das coisas. Isto se dá através do método dialético, o qual elimina as
aparências e encontra as essências, a verdade no conhecimento das coisas. Este
método filosófico tem por finalidade libertar os homens da ignorância e
levá-los ao conhecimento de ideia em ideia, até alcançar o conhecimento da
Ideia Suprema: o Bem. As outras ideias participam desta e devem sua existência a
esta.
O Bem ilumina o ser com verdade,
permitindo que seja conhecido, assim como o Sol ilumina os objetos e permite
que sejam vistos – nota-se aqui a analogia entre Bem e Sol apresentada no mito
da caverna. Existem diversas ideias e é devido à participação nestas, mesmo que
enquanto cópia imperfeita, que se fez possível o mundo sensível. Ao contemplar
a ideia do Bem, o homem passa a sofrer as exigências do Ser, isto é, suas ações
devem ser pautadas conforme a ideia contemplada.
A alma humana – de suma relevância para
a ética platônica- é tripartite, isto é, forma-se pela inteligência, pela
irascibilidade e pela concuspiscência. Tal como as partes da cidade ideal, cada
uma das partes da alma possui suas funções específicas que não podem ser
exercidas por nenhuma das outras partes. Cada uma das partes da cidade e, por
analogia, cada uma das partes da alma, possui uma função própria a qual pode
ser executada com excelência ou não, e, ao executá-la com excelência, sua
virtude própria é exercida.
A virtude é definida, pois, como
capacidade de realizar a tarefa que lhe é inerente. No caso do governante da
cidade e da alma racional, a virtude inerente aos mesmos é a sabedoria; no caso
dos guerreiro e da parte irascível da alma, a virtude que lhes é própria é a
coragem; por fim, no caso da parte concupiscente da alma e dos produtores de
bens da cidade, a virtude própria é temperança. Dada a posição de cada classe,
pode-se definir a justiça como cada parte fazendo o que lhe compete, conforme
suas aptidões. Portanto, ao estabelecer uma relação de analogia entre a
sociedade e indivíduo, Platão define o conceito de justiça – o qual seria
também concebido como princípio de equilíbrio do indivíduo e da sociedade – e o
liga ao conceito de virtude.
O sentimento de justiça é, pois, a
virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta
virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si mesmo, porque ele
realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social.
A ética platônica ocupa-se com o
correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade. Contudo, o
discurso ético apresentado na República acerca da felicidade relaciona esta com
o conceito de justiça. O problema da justiça enquadra-se no âmbito político, o
qual tem estreita relação com o campo da ética: é deste modo que surge a tese
central de que só o justo é feliz. No diálogo República, buscando a
constituição da cidade ideal, surge o problema cerne acerca da definição da
justiça para que se pudesse, posteriormente, definir o que é a justiça tanto no
indivíduo quanto no Estado. Há, pois, um paralelo entre Estado e indivíduo a
fim de que se encontre a definição de justiça.
Para Platão, a sociedade seria como
algo orgânico e bem integrado, como uma unidade construída por vários elementos
independentes, embora integrados. A cidade forma-se por três classes, como já
apontamos, e cada classe possui sua função específica. Deve-se notar que tais
funções são determinadas conforme as aptidões naturais de cada membro da
cidade. O objetivo desta divisão é mostrar com mais clareza como ocorre o mesmo
na alma humana. A finalidade da cidade justa e boa é, então, propiciar a
felicidade do indivíduo ao viabilizar a prática de suas virtudes, de suas
aptidões específicas.
Devemos ter em mente que a virtude
correspondente a cada classe da cidade e a cada parte da alma humana deve ser
ensinada visando a realização do ideal da polis. Esta educação embasa-se no
método dialético ascendente, o qual liberta o homem dos sentidos e o eleva até
o mundo inteligível, até o ponto mais claro do Ser, a ideia do Bem. Após
contemplar o Bem diretamente, o filósofo deve retornar à cidade que lhe
propiciou educação de modo a guiar os outros cidadãos da ignorância ao
conhecimento racional.
As ideias – das quais se originam as
cópias sensíveis – são, pois, existentes em si e por si, são realidades
universais, eternas, imutáveis. Por tais motivos, são os modelos a serem
seguidos, são paradigmas para a construção da cidade ideal e para a educação
moral, política e espiritual do homem. Além do mais, são ordenadoras do cosmos.
Fica evidente que a proposta de Platão
liga-se, principalmente, às ideias de Justiça e do Bem – este último é o
supremo valor que sustenta a justiça com relação à organização política e à
conduta individual. O equilíbrio entre as três partes componentes da alma e da
cidade gera equilíbrio, harmonia e leva à felicidade. Assim, Platão busca por
definições gerais, universais, imutáveis, eternas, existentes por si mesmas: as
Ideias. Como veremos adiante, tal busca é oposta à busca aristotélica pela
virtude ligada à aplicabilidade desta.
A Ética de
Aristóteles: A ética aristotélica, em oposição à ética de seu mestre, é
imanente, tendo suas bases na realidade empírica do mundo, no questionamento
acerca das condutas humanas e na organização social. As exigências com relação
à vida na polis e a realidade do homem formam o conteúdo das ideias, e são
ambas as responsáveis pela escolha dos valores, pela moralidade e pelas leis,
pela definição das condutas dos homens. Sua teoria ética era realista,
empirista em contrapartida à visão idealista e racionalista de Platão.
A ética aristotélica inicia-se com o
estabelecimento da noção de felicidade. Neste sentido, pode ser considerada
eudemonista por buscar o que é o bem agir em escala humana, o agir segundo a
virtude – diferentemente de Platão, que buscava a essência das ideias de
felicidade e da ideia do Bem sem relacioná-las diretamente à prática. A
felicidade é definida como uma certa atividade da alma que vai de acordo com
uma perfeita virtude. Partindo dessa definição, faz-se necessário um estudo
sobre o que é uma virtude perfeita e, assim, faz-se necessário, também, o
estudo da natureza da virtude moral.
A virtude é definida pelo Estagirita
como hábito ou disposição racional constante, sendo a virtude o hábito torna o
homem bom e o capacita na boa execução de sua função. Esta definição se mostra
oposta à de Platão: a virtude é definida como capacidade de realizar uma função
determinada, inerente a alguma parte da alma humana ou da cidade ideal.
A virtude moral é consistida por uma
mediedade relativa a nós e o filósofo define- a como disposição – já que não
podem ser nem faculdades nem paixões – para agir de forma deliberada, sendo que
a disposição está de acordo com a reta razão. Após estabelecer a virtude moral
como uma disposição – héxis – ou seja, como se dá o comportamento do homem com
relação às emoções, há ainda a necessidade de que a diferença específica entre
virtude moral e virtude intelectual seja explicitada. O Estagirita, em
contrapartida às visões de Sócrates e Platão, atribui um papel importante dos
sentimentos no âmbito ético, pois esta parte emocional da alma também é
responsável na formação das virtudes, quando em conformidade com a parte
racional.
O que distingue as duas espécies de
virtude é a mediania. A virtude intelectual é adquirida através do ensino, e
assim, necessita de experiência e tempo. A virtude moral é adquirida, por sua
vez, como resultado do hábito. O hábito determina nosso comportamento como bom
ou ruim. É devido ao hábito que tomamos a justa-medida com relação à nós. Logo,
a mediania é imposta pela razão com relação às emoções e é relativa às
circunstâncias nas quais a ação se produz.
Nenhuma das virtudes morais surge nos
homens por natureza – ao contrário da visão inatista platônica – porque o que é
por natureza não pode ser alterado pelo hábito, a natureza nos capacita em
receber tais virtudes e esta capacidade em recebê-las é aperfeiçoada pelo
hábito. Virtudes e artes são adquiridas pelo exercício, ou seja, a prática das
virtudes é um pré-requisito para que se possa adquiri-las. Sem a prática, não
há a possibilidade de o homem ser bom, de ser virtuoso.
Neste ponto da exposição aristotélica,
podemos notar outra oposição com relação à ética platônica: conforme esta, o
homem só pode ser bom e virtuoso ao contemplar a ideia do Bem – o que aponta
para a diferença entre as concepções idealistas/racionalistas apresentadas por
Platão e as concepções realistas/empiristas expostas pelo peripatético.
Aristóteles critica a identificação feita por seu mestre entre virtude e
conhecimento, de modo que conhecer a essência da Justiça implicaria em ser
justo, haja vista que são identificados. Assim, o conhecimento da ideia do Bem
seria a condição para o bem agir, e a virtude consistiria em somente um tipo de
conhecimento teórico, conforme a crítica feita pelo Estagirita. Este afirma que
a razão não é a única a atuar na determinação da boa conduta, devendo-se levar
em conta os sentimentos por auxiliarem na formação das virtudes, além do fato
de que as virtudes implicam uma atividade racional.
Como vimos, as virtudes morais são
vistas como produto do hábito, consequentemente não são tomadas como inatas –
como o fizeram Sócrates e Platão. Ao considerar as virtudes morais como
adquiridas, há uma implicação de que o homem é causa de suas próprias ações,
responsável por seu caráter – por esse motivo a ação precede e prevalece sobre
a disposição – o que refuta a ideia platônica de que o homem que age mal, o faz
por ignorância, pois o mal é a ausência do bem. Está na natureza das virtudes a
possibilidade de serem destruídas pela carência ou pelo excesso e cabe à
mediania preservar as virtudes morais e também diferenciá-las das virtudes
naturais. Pode-se notar, pois, que a ideia de justa-medida preconiza que
qualquer virtude é destruída pelos extremos: a virtude é o equilíbrio entre o
sentir em excesso e a apatia. Portanto, fica evidente que a virtude busca pela
harmonia – e esta é dada pela razão entre as emoções extremas. O meio-termo é
experimentar as emoções certas no momento certo e em relação às pessoas certas
e objetos certos, de maneira certa. Isso é a mediania, é a excelência moral, a
qual diverge da noção platônica de excelência moral, que seria cada parte da
alma exercer sua tarefa própria da melhor maneira possível, com excelência para
exercer sua respectiva virtude.
Ao propor a mediania como gênero de
virtude moral, como regra moral, o Estagirita retornou à sabedoria grega
clássica, porque esta indicava a mediania como a regra de ouro do agir moral. A
mediania tem o aspecto de não silenciar as emoções, mas buscar a proporção e,
devido a essa proporção, a ação será adequada sob a perspectiva moral e,
concomitantemente, a ação ficará ligada às emoções e paixões – contrariamente à
doutrina platônica, na qual a ação moral tem uma relação intrínseca com a
contemplação do Bem. De acordo com Aristóteles, a posição de meio é o que tem a
mesma distância de cada um dos extremos. Com relação a nós e sempre considerando
nesse viés, meio é o que não excede nem falta. Aqui fica evidente que o “meio”
se dá em relação ao agente, pois não é válido para todos.
A virtude moral deve possuir a
qualidade de visar o meio-termo por se relacionar com as paixões e ações. Nas
ações e paixões, por sua vez, existem a carência, o excesso e o meio-termo. As
ações e os apetites não tem, em sua natureza, algo que determine sua tendência
para a falta ou para o excesso. Por sua vez, a tendência à mediania expressa a
virtude moral, expressa a excelência da faculdade desiderativa da alma. O que
nos faz tender à mediania é a educação e a repetição de atos bons e nobres. Por
conseguinte, o hábito é desenvolvido e visa a mediania. Esta, por sua vez, é
determinada segundo um princípio racional. Pode-se notar que, para Aristóteles,
a virtude é uma espécie de mediania já que visa o meio-termo e que é vista como
disposição de caráter que tem relação com a escolha dos atos e das paixões. A
justa-medida é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de
sabedoria prática. Assim, ao buscar pela essência da virtude, por sua
definição, Aristóteles define-a como mediania.
O Estagirita afirma que sua
investigação acerca da virtude não é de cunho exclusivamente teórico, como a
realizada por Platão, mas a investigação se dá com a finalidade de que os
homens tornem-se bons – pois cabe à mesma ciência, ou seja, à Ciência Política,
tanto o conhecimento das virtudes quanto a função de fazer com que os homens se
tornem bons. Logo, busca-se a definição de virtude e sua aplicação nos fatos
particulares.
A virtude é um meio-termo entre dois
vícios. Um desses vícios envolve o excesso e o outro vício envolve a carência.
Logo, cabe à virtude e à sua natureza visar a mediania tanto nas ações – embora
algumas ações não permitam um meio-termo por seus próprios nomes já implicarem,
em si mesmos, maldade – quanto nas paixões. Um dos extremos – entre os quais a
mediania se localiza – é mais equivocado que o outro. Deve-se, portanto, estar
atento aos erros para os quais tem-se maior facilidade para ser arrastado.
Pode-se saber para qual erro se é arrastado ao se analisar o prazer e o
sofrimento acarretado pelo mesmo. Ao descobrir para qual erro se tende mais,
deve-se ir em direção oposta, ao outro extremo para que se chegue ao estado
intermediário e, consequentemente, afastar-se do erro.
Em todas as coisas, o meio-termo é
digno de ser louvado. Contudo, ora deve-se inclinar no sentido do excesso, ora
da falta com a finalidade de se chegar mais facilmente ao que é correto e ao
meio-termo. Ao longo das exposições acerca das perspectivas éticas de Platão e
Aristóteles, podemos perceber convergências e divergências, sendo que estas
foram explicitadas de modo geral.