A questão colocada por Nietzsche no texto “Sobre verdade e mentira no sentido extra moral” se da sobre as perguntas: O que aconteceria se a verdade dos enunciados fosse apenas um engano ? E se a condição da verdade fosse a mesma da mentira ? Isso iria mostrar tão somente o caráter dissimulador do intelecto humano e da fragilidade das condições absolutas de verdade. É justamente a essa conclusão que Nietzsche quer nos esclarecer. Com esta fábula, Nietzsche pretende nos mostrar o quão sem importância e pequenos nós somos diante da existência. Acreditamos que por nosso intelecto somos seres superiores. Ficamos cegos pela própria luz que pensamos emanar. Como não possuímos atributos corporais naturais para lutarmos pela nossa existência tivemos que procurar um meio alternativo. A natureza negou aos homens meios físicos naturais para lutar pela vida, e deu-lhe em compensação o intelecto.
Porém, mesmo com estratagemas o homem precisava lutar. Portanto, assim como os outros animais o homem também recebeu os sentimentos básicos de preservação da espécie, os instintos. Quando, para sobreviver, elaborávamos algum artifício enganador e astucioso, eram estes sentimentos primordiais que nos moviam. Enquanto que nos outros animais, naturalmente paramentados para a luta, tais fatores encontram diretamente uma exteriorização no próprio corpo, no homem tal processo não ocorre sem antes passar pelo intelecto. Segundo Nietzsche o homem é o criador dos valores, mas esquece sua própria criação e vê neles algo de transcendental de eterno e verdadeiro, quando os valores não são mais que algo humano e demasiadamente humano.
O homem em sua vaidade acredita andar com as próprias pernas, sem perceber, entretanto, que seus movimentos são ditados por forças primitivas, das quais não se dá conta. Nietzsche apresenta uma oportunidade para abrirmos os olhos para outra realidade. Ele nos coloca a questão mais fundamental: como podemos esperar ouvir a verdade do mestre da mentira sem que mintamos para nós mesmos? A mentira efetiva-se ao expressar alguma coisa diferente do que percebe e sente como realidade. Porém, o homem só será punido em consideração aos seus fins e objetivos. Por si só, a verdade e a mentira nada significam de bem ou de mal.
A verdade é uma designação, tomada universalmente como válida, dada à expressão do que uma pessoa percebe e sente como realidade. Logo, a verdade está submetida às convenções da linguagem. Mas, por mais rigorosas que possam ser tais convenções, toda expressão é expressão de um sujeito. Assim, acontece com os nossos conceitos. No dicionário Aurélio, encontramos a seguinte definição para conceito: representação dum objeto pelo pensamento por meio de suas características gerais. O intelecto é imanente ao homem e não lhe cabe nada que não seja inteiramente humano.
O que compreendemos não são as “coisas em si”, diretamente. Enxergamos relações entre elas e entre elas e nós mesmos. O que designamos como coisas e objetos são na verdade conjuntos de relações antropomórficas. Interagimos com o mundo mediado por uma teia de relacionamentos herdada, que compõe a nossa bagagem cultural. Quando enxergamos algo, o vemos de um ponto de vista legitimamente humano. De acordo com Nietzsche a verdade nasce desta obrigação impingida por pacto social. O mentiroso é mal visto, castigado e excluído pelos outros membros da comunidade. Para ser respeitado é necessário orientar-se sempre pela verdade. Mas esta verdade nada mais é do que uma convenção social com o objetivo de regular os inter-relacionamentos humanos e possibilitar a formação de uma comunidade.
Em nossa busca cega pela verdade, somos incapazes de perceber a completa falta de sentido deste empreendimento. Somos homens e, como tais, tudo o que nos cabe ser, viver e experimentar é inexoravelmente humano. Tudo que possamos ver e compreender serão feito a partir de uma perspectiva humana e não passará de uma representação de nós mesmos.
A posicionamento de Nietzsche nos mostra que não existe um sentido original, pois as próprias palavras não passam de interpretações, antes mesmo de serem signos. As palavras segundo Nietzsche, sempre foram inventadas pelas classes superiores, e assim não indicam um significado, mas impelem uma interpretação. O trabalho do filósofo (Etmologista), portanto deve centralizar-se no problema de saber o que existe para ser interpretado na medida em que tudo é mascara, interpretação avaliação, fazer isso é avaliar o que vive é dançar e criar.