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JOHN LOCKE

"todos os homens, que, sendo todos iguais e livres, nenhum deve prejudicar o outro, quanto à vida, à saúde, à liberdade, ao próprio bem". E, para que ninguém empreenda ferir os direitos alheios, a natureza autorizou cada um a proteger e conservar o inocente, reprimindo os que fazem o mal, direito natural de punir"

FRIEDRICH HAYEK

“A liberdade individual é inconciliável com a supremacia de um objetivo único ao qual a sociedade inteira tenha de ser subordinada de uma forma completa e permanente”

DEBATES FILOSÓFICOS

"A filosofia nasce do debate, se não existe a liberdade para o pensar, logo impera a ignorância"

A Filosofia é.....

"Viver sem filosofar é o que se chama ter os olhos fechados sem nunca os haver tentado abrir". Descartes

LIBERDADE

"Liberdade, Igualdade , Fraternidade. Sem isso não há filosofia. Sem isso não há existência digna.

"Nós temos um sistema que cobra cada vez mais impostos de quem trabalha e subsidia cada vez mais quem não trabalha"

LUDWING V. MISES

"O socialismo é a Grande Mentira do século XX. Embora prometesse a prosperidade, a igualdade e a segurança, só proporcionou pobreza, penúria e tirania. A igualdade foi alcançada apenas no sentido de que todos eram iguais em sua penúria"

sexta-feira, 23 de junho de 2017

O MAL-ESTAR NA CIVILIZAÇÃO MODERNA

Em seu texto de 1920, “O mal-estar na civilização”, Freud  chegou a conclusão que o indivíduo não pode ser feliz na civilização moderna. Mesmo com todo progresso técnico e cientifico o homem não se tornou mais feliz. Ao refletir sobre o propósito da vida, ele diagnosticou que o objetivo da civilização não é a felicidade, mas é a renúncia a ela.    A vida do indivíduo é a busca constante pela realização da satisfação do prazer, mas esta  satisfação é impossível de realizar num mundo carente e escasso de recursos.  O mundo é hostil as necessidades humanas, para tudo que é bom e prazeroso exigem-se trabalhos penosos e sofrimentos.  A manutenção da  civilização exige que os individuos trabalhem. Mas os homens não são amantes do trabalho e os argumentos não tem valia nenhuma contra suas paixões.  Assim, é somente através da repressão social que os indivíduos são obrigados a trabalhar.  
        Na teoria da cultura freudiana, a sexualidade é a pedra fundamental na manutenção e reprodução da civilização. A civilização só pode existir porque os impulsos sexuais são canalizados para o trabalho, gerando todos os bens materiais e intelectuais da civilização.  “A civilização está obedecendo às leis da necessidade econômica, visto que uma grande quantidade de energia psíquica que ela utiliza para seus próprios fins tem de ser retirada da sexualidade” (FREUD, 1969, p. 125). Em conseqüência disso, Freud atribuiu as doenças psíquicas de sua época a grande repressão que a civilização exerce sobre os impulsos sexuais. Essa insatisfação foi exigida num grau muito superior que o necessário. O processo civilizatório é marcado pela renúncia e pelo sentimento de insatisfação que os homens experimentam vivendo em sociedade.  O resultado disso é o mal-estar na civilização. Este mal-estar é produzido pelo conflito irreconciliável entre as exigências pulsionais e as restrições da civilização.    
        Hoje, em pleno século XXI, podemos dizer que nossa época melhorou muito. A vida tornou-se um pouco mais digna; as taxas de crescimento da natalidade e o aumento da expectativa de vida demonstram a melhoria. A saúde e o saneamento básico já atingem a grande maioria da população mundial. O analfabetismo já não é um problema grave dos países subdesenvolvidos.  Há uma maior tolerância à liberdade sexual.  A população de hoje usufrui mais e melhor dos bens culturais. No entanto, o mal estar na civilização não desapareceu.  Em nossa época, o mal-estar assume novas formas, ela estaria mais associada às condições econômicas e sociais que os indivíduos experimentam no mundo moderno. Nós, filhos da modernidade, somos espectadores de uma experiência que melhor se conceitua como fome, miséria, barbárie, guerras, desemprego, instabilidade econômica e social.  Todos esses fatores geram a insegurança social no indivíduo e, conseqüentemente, são responsáveis pelas doenças psíquicas de nossa época.  No atual estágio de nossa civilização não sabemos se nossas perspectivas serão realizadas. O mundo se torna cada vez mais racionalizado e o trabalho se torna cada vez mais dispensável.  A racionalidade técnica cria cada vez mais domínio de objetos e instrumentos que acabam por mecanizar todas as estruturas sociais.   O homem, entendido como homo faber está perdendo sua importância. Nós vivemos uma época de desemprego estrutural (desemprego causado pela mecanização das estruturas sócias). Esse desemprego atinge todos os países e torna inexorável o fim da sociedade do trabalho. O homem tem se tornado uma peça inútil na estrutura dos meios de produção. A possibilidade de uma mecanização completa em todas as esferas da vida social é uma possibilidade histórica. Esse fato deve abalar o narcisismo do homem.  O indivíduo se vê sem ocupação e sem perspectivas. Ele perde sua identidade na medida em que perde sua ocupação. Ele torna-se um indivíduo à margem, mais um na massa de desempregados. É este mal-estar na civilização, que surge da preocupação, do medo e da insegurança que procuramos diagnosticar. 
        Na época de Freud, o puritanismo, os tabus e a enorme rigidez contra os impulsos sexuais poderiam dar razões para se afirmar que o mal-estar surgisse das restrições à vida sexual. Contudo, vivemos em uma época onde a liberdade sexual é tolerada e até mesmo incentivada.  A sexualidade perdeu sua importância como fator preponderante nas crises de ansiedade e de neuroses.  No atual estágio do progresso humano, as restrições à sexualidade tornaram-se desnecessárias. Com o desenvolvimento técnico e cientifico, o uso das pulsões sexuais na criação dos bens culturais perdeu sua importância. O homem já não precisa mais sacrificar sua sexualidade em nome do progresso. Hoje a racionalidade atingiu todas as esferas da vida social. O progresso técnico atingiu tal amplitude que já não é mais necessário desviar as pulsões sexuais para o trabalho competitivo. Em um futuro próximo, não será mais preciso o uso das forças humanas na produção e reprodução dos bens culturais. As pulsões estariam livres da repressão imposta pelo trabalho social. Dessa forma, o mal-estar do indivíduo na civilização já não surge mais da insatisfação libidinal. Já não é mais de uma tensão física, sexual, que causa a ansiedade, mas é uma tensão psíquica, causada pela preocupação, pelo medo e pela insegurança, causada por condições econômicas e sociais. Os estímulos externos causam todo tipo desajuste psíquico.  É comum a experiência da melancolia, da depressão, do desânimo, do desinteresse pela vida, da baixa auto-estima e da sensação de inutilidade.  As doenças, que eram menos comuns na época de Freud,  tornaram-se grandes problemas para psicólogos e psiquiatras: são os traumas de roubos e de sequestros, a síndrome do pânico, a compulsão de consumo, a síndrome de perseguição, a misantropia e a depressão. Todas essas doenças são acompanhadas de crises de ansiedade. São doenças típicas de nossa época,  que estão associadas ao mal-estar na civilização.                      
             Segundo Mezan (2000), na época de Freud a sociedade era mais rigidamente patriarcal e com valores claramente identificáveis, nossa época tornou-se mais relativista e fragmentária. Os ritmos de mudança na sociedade contemporânea se tornaram alucinantes, deixando os indivíduos desorientados e pressionados pelas exigências do dia-a-dia.  Se na época de Freud os valores eram bem estabelecidos, em nossa época não há mais valores ou rumos pré-estabelecidos a serem seguidos. A família como formadora da individualidade se fragmentou. Os laços familiares se tornaram frágeis por causa das exigências do mundo exterior. A família não constitui mais um núcleo fixo de produção da subjetividade. Todos os indivíduos devem trabalhar se querem viver. A criança não tem mais o convívio do pai. O pai deixou de ser um parâmetro ou modelo a ser seguido. Não há mais parâmetros ou padrões definidos.  A Tv, a escola e as instituições sociais ensinam os modelos,  as formas de ser, de pensar, de agir e de valorizar. O indivíduo moderno está desamparado e desorientado. Seu modelo é o patrão, o playboy rico, o traficante do bairro ou o artista de novela.  O distanciamento da autoridade paterna causou ao indivíduo o desnorteamento e a insegurança frente ao mundo exterior.        
         O mal-estar na civilização é a condição existencial do homem moderno, é o destino que todos temos de compartilhar. O simples fato de o indivíduo viver no mundo contemporâneo já é o requisito para se viver ansioso. A sociedade industrial, a competitividade, o consumo desenfreado, o desemprego, a violência, a dinâmica das transformações sociais e dos valores, a adaptação do indivíduo as exigências da vida são os principais fatores que produzem o mal-estar na civilização. 
Bibliografia
FREUD, SO mal-estar na civilização. Rio de Janeiro, Imago,   Edições Standard, Tomo  XXI ,1969.
 MEZAN, Renato . O Mal-Estar na Modernidade. Revista Veja, São Paulo, p. 68 – 70, 26 dez. 2000. 

OS CINCO MAIORES ARREPENDIMENTOS NO LEITO DE MORTE: UMA REFLEXÃO SOBRE A FELICIDADE

“Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria mais tolo ainda do que tenho sido; na verdade, bem poucas pessoas levariam a sério. Seria menos higiênico. Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria  mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios. Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria mais sorvete e menos lentilha, teria mais problemas reais e menos imaginários. Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e produtivamente cada minuto da vida. Claro que tive momentos de alegria. Mas, se pudesse voltar a viver, trataria de ter somente bons momentos. Porque, se não sabem, disso é feito a vida: só de momentos – não percas o agora. Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas; se voltasse a viver, viajaria mais leve. Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono. Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente. Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo”.
        Este é um poema da escritora americana Nadine Stair, falsamente atribuído a Jorge Luiz Borges, escritor Argentino. Mas isso não é um problema, o mais importante é que ele é uma promessa de felicidade,  nos faz refletir sobre nossas vidas.  O poema retrata os arrependimentos de quem está à beira da morte. Trata do mesmo assunto do livro, “The top five regrets of the dying” (Os cinco maiores arrependimentos de pacientes terminais). A autora Bronnie Ware é uma enfermeira australiana que, depois de muitos anos de trabalho com doentes terminais,  relatou em seu livro quais são os cinco maiores arrependimentos que os seres humanos têm antes de morrer. Gostaria de fazer uma breve reflexão sobre esses arrependimentos, procurando entender as razões que levam os homens a se autoenganarem em busca da felicidade.
       O primeiro arrependimento dos doentes terminais é “não terem tido a coragem de viver a vida que quiseram, mas sim a vida que os outros esperavam deles”. Na grande parte de suas vidas os homens vivem de forma irrefletida, são incapazes de viver uma vida autêntica, segundo suas escolhas. Aceitam sua existência como uma imposição do destino. Não vislumbram uma vida diferente dá que levaram. Vivem conforme os preceitos e os valores de sua sociedade. Ter uma profissão, casar, ter filhos, vencer na vida e na profissão, ganhar dinheiro e prestígio são as ilusões que os motivam. Quando se dão conta que perderam as energias e estão próximos da morte, começam a refletir sobre suas escolhas. Percebem que grande parte de seus sonhos e desejos não foram realizados, e culpam a si mesmos por causa das decisões que tomaram ou deixaram de tomar. Schopenhauer compreendeu muito bem esse estado de inconsciência. Segundo o filósofo, “assim como um regato corre sem ímpetos, enquanto não encontra obstáculos, do mesmo modo na natureza humana (…) a vida corre inconsciente e descuidosa, quando coisa alguma se lhe opõe à vontade. (…) Tudo o que se ergue em frente da nossa vontade, tudo o que a contraria ou lhe resiste, isto é, tudo que há de desagradável e de doloroso, sentimo-lo ato contínuo e muito nitidamente. Não atentamos na saúde geral do nosso corpo, mas notamos o ponto ligeiro onde o sapato nos molesta” (Schopenhauer, D.M.). É somente na doença que os indivíduos prestam atenção à vida. Quando tudo vai bem não percebem a existência passar. Quando estão ativos e com saúde não refletem sobre as suas vidas, sobre o sentido e significado que ela tem para eles.  Só a percebem quando estão gravemente doentes ou correm risco de vida.  “Enquanto possuímos saúde, juventude e liberdade não temos consciência deles, e só os apreciamos depois de havermos perdido” (idem, Ibidem).
    Além de perceberem que viveram de forma inconsciente, ao refletirem sobre suas vidas, os doentes terminais também perceberam que sempre estiveram preocupados com a opinião alheia, sendo guiados por toda forma de preconceito. Viveram conforme os outros desejavam e não como deveriam viver. Foram autosugestionados. Foram incapazes de refletirem sobre suas ações e seus verdadeiros desejos. Ficaram com medo de magoar ou medo de expor seus sentimentos. Por causa disso, tiveram sua interioridade dividida, uma vez que desejavam levar uma vida diferente dá que levaram, mas foram covardes em não realizarem seus desejos mais íntimos.  Viveram num eterno dilema interior, numa eterna angústia. O que lhes faltava era reflexão e coragem.  Foram incapazes de se autoexaminarem e se decidirem com autodeterminação. A falta de sentido de suas vidas provém da incapacidade de se autoconhecerem e de agirem como seres pensantes e autônomos. Ao não perscrutarem e analisarem sua existência e seu mundo  interior tornaram-se incapazes de dirigirem suas próprias vidas.
     O segundo arrependimento descrito pelos doentes é “terem trabalhado muito durante a vida”.  Gostariam de ter curtido mais os filhos e o casamento. A grande parte da existência dos homens é vivida no trabalho. Parece um destino inexorável. Hoje com progresso técnico e científico já não é mais necessário que se trabalhe tanto, mas isso não é levado a sério. O que podemos observar é que os homens trabalham tanto como na época da revolução industrial. A busca desenfreada pelo dinheiro, o consumismo exacerbado, a busca da diferenciação simbólica têm incentivado os indivíduos trabalharem cada vez mais.  No trabalho os homens perdem uma grande parte de sua existência, se alienam de suas vidas e de si mesmos, assim como perdem a noção da representação do tempo. O trabalho ocupa a maior parte da vida dos indivíduos.  Os antigos gregos se referiam ao tempo de duas formas: o tempo cronológico, quantitativo, sequencial, existencial, eles chamavam Khronos (o tempo dos homens). Já o tempo eterno, qualitativo, de algo especial, do momento oportuno, do instante singular, eles denominavam Kairós (o tempo dos deuses).  O tempo cronológico, do trabalho, da labuta, tornou-se parte do ser humano. Isso significa que o tempo do Khronos foi interiorizado de tal modo que se tornou uma dimensão da natureza humana.   O tempo de trabalho foi supervalorizado, já o tempo dos momentos especiais perdeu valor. O homem moderno praticamente abandonou o tempo de Kairos. O tempo de Kairós são os momentos que brincamos com nossos filhos, que estamos com os amigos, que lemos, refletimos, contemplamos a natureza ou que fazemos algo que gostamos. São esses momentos especiais que ficam eternizados em nossa memória. São esses momentos que desvalorizamos por causa do trabalho.
    O terceiro arrependimento dos doentes terminais foi “não terem tido a coragem de expressarem seus sentimentos” A enfermeira Bronnie Ware relatou em seu livro que muitas pessoas suprimiram seus sentimentos para ficar em paz com os outros. Como resultado, se acomodaram em uma existência medíocre e nunca se tornaram quem eles realmente eram capazes de ser. Muitos desenvolveram doenças relacionadas à amargura e ressentimento que carregavam. Segundo o filósofo alemão Nietzsche, o ressentimento é característico de homens sem forças para reagir diante dos problemas e dos imprevistos da vida e que não conseguem digerir sentimentos nocivos produzidos por sua incapacidade de reação.  São homens incapazes de vingança das ofensas recebidas, que remoem dentro de si impressões negativas. O grande conselho do filósofo é não calar. Responder as ofensas, expressar os sentimentos, afirmar a vontade, encarar a vida com toda sua fealdade é um grande sinal de saúde.  “Aos que silenciam falta-lhes quase sempre finura e cortesia do coração; silenciar é uma objeção, engolir as coisas produz necessariamente mau caráter – estraga inclusive o estômago. Todos os calados são dispépticos” (Nietzsche, 2008, p.27).
         O quarto maior arrependimento é “não terem ficado mais em contato com os amigos como gostariam”. Segundo a enfermeira Bronnie Ware, muitas vezes os pacientes não compreendem verdadeiramente os benefícios dos velhos amigos até estarem no leito de morte. Eles estavam tão envolvidos com suas vidas que deixaram para trás muitas amizades valiosas.  Arrependeram-se de não terem dedicado tempo e esforços aos amigos.  É somente no final da vida que percebem que tudo o que resta é o amor e os relacionamentos, diz ela. Todos sentem falta dos amigos na hora da morte. É natural esse sentimento, uma vez que a amizade surge de uma grande afeição, afinidade e conhecimento mútuos.  A amizade produz a cumplicidade, a lealdade, o altruísmo e a benevolência. Ela deixa marcas indeléveis no espírito humano. Contudo, nos dias de hoje, os homens não se encontram mais rodeados por outros homens, mas por objetos. Afinal, vivemos na sociedade do consumo. As relações sociais já não são tanto com seus semelhantes, mas com as coisas. Os homens se dedicam com muito mais afinco ao consumo e a busca da riqueza do que com a amizade. Sócrates no século V a.C. já havia notado que a grande preocupação que motivava os homens de sua época era o corpo, a beleza e a riqueza. Isso não mudou de lá para cá. Os homens vivem em permanente catarse, estão permanentemente iludidos, sempre em busca de satisfazer algum desses desejos. Esse é um dos maiores erros na busca da felicidade.
      O quinto e último arrependimento se refere propriamente à felicidade, os pacientes no leito de morte “gostariam de terem se permitido serem mais felizes”. Segundo a enfermeira Bronnie, esse arrependimento é muito comum. Muitos só percebem  que a felicidade é uma escolha no final da vida. Eles ficaram presos a antigos hábitos e padrões. O conforto familiar transbordou em suas emoções, como em suas vidas. O medo de mudança fez com que fingissem para os outros e para si mesmos que estavam contentes. Mas no fundo, diz ela,  queriam rir de verdade e fazer novamente coisas bobas na vida. Por isso não foram plenamente felizes.  A felicidade é a satisfação de uma falta, uma carência, um desejo. Mas ela só se realiza na ação. Essa ação muitas vezes deve se fundar na superação de um conflito, de um dilema, de uma frustração, de um sofrimento. O importante é que esses obstáculos sejam superados, mesmo que seja na dor. É nessa busca reflexiva onde a ação é norteadora que renascemos e podemos nos fundar como seres plenos de alegria. “Fundar-se é escolher e construir por si próprio os princípios de sua própria existência; o ato de fundação é o ato da autonomia e vale porque é um gozo, o gozo criador da liberdade. Essa liberdade, nova e segunda em relação à liberdade confusa da espontaneidade, é a um só tempo criação e ruptura. Ela inaugura um novo desejo e regozija-se por isso mesmo de uma nova existência, em que o sujeito renasce e dá início a si mesmo” (Misahi, 1999, 46).  Devemos ser, portanto, plenamente sujeitos de nossa felicidade. Não sujeitos abstratos, mas sujeitos conscientes de nossa busca  rumo à satisfação plena de nossos desejos. Devemos seguir o conselho da enfermeira Bronnie, “a vida é uma escolha. É a sua vida. Escolha conscientemente, escolha sabiamente, escolha honestamente. Escolha a felicidade”.
Bibliografia
MISHAHI, Robert. A felicidade é nosso único objetivo. In: Le Nouvel Observateur, Café Philo. Rio de Janeiro: Zahar, 1999, p.43-47.
NIETZSCHE, Friedrich. W. Ecce Homo. Trad. Paulo César Souza. São Paulo: Companhia da Letras, 2008.
SCHOPENHAUER, Arthur. Dores do Mundo. Disponível em < http://pt.scribd.com/doc/58683158/Arthur-Schopenhauer-Dores-Do-Mundo> acesso em Janeiro de 2013.
WARE, Bronnie.  Regrets of the Dying. (Official Site).  Disponível em < http://www.inspirationandchai.com/Regrets-of-the-Dying.html> acesso em Janeiro de 2013.

A FILOSOFIA É EM SUA ESSÊNCIA REVOLTA


A filosofia é em sua essência revolta, uma vez que ela é pensamento crítico e radical sobre a realidade. Seu objetivo é desfazer os nós dos problemas. A filosofia procura tornar claro aquilo que é obscuro.  Ela é um discurso reflexivo sobre a realidade, e sobre toda forma de crença e misticismo. Ela busca a clareza para lançar luz sobre a penumbra. Por este motivo, não há filosofia sem revolta. A revolta surge quando tudo se torna claro, quando por um ato de intuição nós chegamos à verdade. Quando nos damos conta da mentira e da ilusão nos revoltamos. É a clareza da verdade que nos perturba. Os gregos entendiam a verdade como “Alethéia”, ou seja, como aquilo que se desvela, aquilo que se descobre. Não há revolta sem esclarecimento, não há revolta sem verdade. O objetivo da filosofia, portanto, é levar os indivíduos à revolta, à verdade.  A revolta nos torna humanos, nos liberta da experiência alienante em que vivemos. “E conhecereis a Verdade, e a Verdade vos libertará” (João 8:32).  A revolta nos faz pensar sobre nossas circunstâncias. Ortega Y Gasset já dizia que o homem rende o máximo de sua capacidade quando adquire consciência de suas circunstâncias. É por meio das circunstâncias que o homem se comunica com o universo. Foi isso que fizeram os gregos quando começaram a filosofar.   Quando os pré-socráticos deram a primeira demonstração lógica e materialista para os fenômenos da natureza, isso significou o primeiro ato de revolta na história do pensamento. Eles deram uma explicação racional e sistemática do universo, se revoltaram contra suas circunstancias, contra as ilusões e os preceitos de sua época. Foi a partir daí que o mundo começou a ser desencantado. Quando Sócrates aceitou passivamente sua condenação à morte, por ter colocado idéias subversivas na cabeça dos jovens, isso foi um grande ato de coragem e de grande revolta, uma vez que mostrava aos seus acusadores que eles  não estavam seguindo a ordem justa da pólis (cidade).  Quando Giordano Bruno aceitou passivamente ser queimado vivo por conceber um mundo infinito, isso também foi um grande ato de coragem e de grande revolta, uma vez que mostrou aos algozes de sua época que num universo infinito o homem não é um ser privilegiado na ordem do mundo.
       Quando pensamos a filosofia como um ato de revolta,  lembramos-nos de imediato de um texto de Deleuze, em “Nietzsche e a Filosofia”. Segundo Deleuze, “quando alguém pergunta para que serve a filosofia, a resposta deve ser agressiva, visto que a pergunta pretende-se irônica e mordaz. A filosofia não serve nem ao Estado, nem à Igreja, que têm outras preocupações. Não serve a nenhum poder estabelecido. A filosofia serve para entristecer. Uma filosofia que não entristece a ninguém e não contraria ninguém, não é uma filosofia. A filosofia serve para prejudicar a tolice, faz da tolice algo de vergonhoso. Não tem outra serventia a não ser a seguinte: denunciar a baixeza do pensamento sob todas as suas formas. Existe alguma disciplina, além da filosofia, que se proponha a criticar todas as mistificações, quaisquer que sejam sua fonte e seu objetivo? Denunciar todas as ficções sem as quais as forças reativas não prevaleceriam. Denunciar, na mistificação, essa mistura de baixeza e tolice que forma tão bem a espantosa cumplicidade das vítimas e dos algozes. Fazer, enfim, do pensamento algo agressivo, ativo, afirmativo. Fazer homens livres, isto é, homens que não confundam os fins da cultura com o proveito do Estado, da moral, da religião. Vencer o negativo e seus altos prestígios. Quem tem interesse em tudo isso a não ser a filosofia? A filosofia como crítica mostra-nos o mais positivo de si mesma: obra de desmistificação. (…) A tolice e a bizarria, por maiores que sejam, seriam ainda maiores se não subsistisse um pouco de filosofia para impedi-las, em cada época, de ir tão longe quanto desejariam, para proibi-las, mesmo que seja por ouvir dizer, de serem tão tolas e tão baixas quanto cada uma delas desejaria. ( Deleuze, 1976, p. 87).  A filosofia como pensamento reflexivo é, portanto, libertadora.  Ela não se submete a nenhuma forma de poder, seja religioso, político ou ideológico. A razão é a faculdade que julga, analisa, discerne e compara, nesse sentido, sua característica fundamental é o livre pensar. É somente através da reflexão que o homem pode sair de sua “menoridade”, alcançando autonomia e liberdade para guiar sua vida. É somente através da reflexão que a humanidade poderá um dia reivindicar um mundo mais justo e feliz.
 Bibliografia
 Deleuze, Gilles. Nietzsche e a filosofia, Ed. Rio, Rio de Janeiro, 1976.
Ortega Y Gasset, J. Meditações do Quixote. São Paulo: Iberoamericana, 1967.

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